domingo, 16 de novembro de 2008

RESENHAS BÁRBARAS, 2 - "Niña de mierda!"



Medéia, de Delacroix




Assisti “Vicky Christina Barcelona”, do Woody Allen. Ele é a prova de que, ao contrário do que diz minha namorada, eu não gosto apenas de filmes com feudos de sangue, katanás ou demonologia. O Woody Allen é o autor mais civilizado do cinema. Seus filmes e temas não retém nada de selvagem, nada de rústico, nada que não seja altamente instruído, ponderado e sofisticadamente cético, nada que não tenha passado por dois milênios de urbanidade e no mínimo duas décadas de psicanálise (ainda que as neuroses permaneçam). Nesse filme, Rebecca Hall e Scarlett Johanson interpretam, em momentos distintos, o próprio Woody Allen, com sua tagarelice nova-iorquina e desarranjos analíticos (assim como fez o Kenneth Brannagh em “Celebridades”). Mas a personagem mais interessante é a da Penélope Cruz, que se sacode, blasfema e berra “niña de mierda!” com a maluquice trágica de uma Medéia moderna. É uma dessas personagens que são mencionadas regularmente ao longo do primeiro ato, mas só aparecem no segundo, já entrando em cena, portanto, com uma aura legendária. É essa personagem que me faz pensar no excesso de civilização dos filmes do Woody Allen, um excesso que é exatamente sua virtude, mas que é também uma espécie de brecha por onde gostamos que a Penélope Cruz entre gritando e desacorçoando, para estropiar o universo. Foi nela que o Rei Lear pensava quando disse: “I will do such things – I do not know what – but they shall be the terror of the earth”. Majestosa.

2 comentários:

Fernando Ferrari disse...

Detesto Woody Allen. Vi os seus filmes demais para gostar dele.
Só tem gente neurótica, sem nenhum romano.
Mas a Penélope Cruz é um partidão. Quase me faz ficar com vontade de ser o Barden, por incrível que pareça.

Anônimo disse...

Eu não gostava dela até "Volver", do Cortázar.
Aliás eu vi uma aparição da Lúcia hoje.