sexta-feira, 14 de novembro de 2008

Três velhos rabugentos em conflito no trem galante das três e meia

Poucos gêneros sofreram tanto nas mãos de maus tradutores quanto o faroeste. Por algum motivo numinoso, faroestes em português têm de ter títulos com expressões hiperbólicas, de preferência incluindo termos como “vingança”, “força”, “inferno”, “paixão”. O mais divertido é que muitos dos títulos em português simplesmente não fazem sentido em relação ao conteúdo dos filmes. Se não, vejamos.

High Noon – Matar ou morrer. O título em inglês resume perfeitamente a trama: os bandidos chegarão à cidade ao meio-dia em ponto, que é mais ou menos o significado de High Noon. Já Matar ou Morrer poderia ser o nome de absolutamente qualquer faroeste feito desde o E.S. Porter até hoje. Por que não “Ficar ou correr”? Ruim por ruim, a minha versão tem uma certa lógica. Bem, mas também não estamos tão mal, porque corre a lenda de que em Portugal o filme se chama “O comboio apitou três vezes”.

The wild bunch – Meu ódio será tua herança. Em bom gauchês, o filme se chamaria “O bando de lôco”, o que pode ser tosco, mas pelo menos faz sentido. O tal ódio vai ser herança de quem, e para quem? Aliás, como assim, herança, se todos os lôcos do bando morrem no final? Que eu me lembre, sobra só o personagem do Sterling Hayden – o único que parece não odiar ninguém – e um cachorro. O ódio é a herança do cachorro? Esotérico.

The good, the bad and the ugly – Três homens em conflito. Essa, por Júpiter, é imperdoável. Por que não aceitar o lindo título “O bom, o mau e o feio”, um dos melhores na história do western? “Três homens em conflito” parece um triângulo amoroso na Grécia antiga, entre dois espartanos e um ateniense, ou algo que o valha. Ou, em última instância, me lembra terrivelmente de “Três velhos rabugentos”.

3:10 to Yuma – “Galante e sanguinário” (nome do original de 1940) ou “Os indomáveis” (nome do remake de 2006). Como assim??? Ok, “O trem das três e dez indo para Yuma” seria impraticável, mas a bisonhice hipotética não justifica a bisonhice factual. Em primeiro lugar, o protagonista não é sanguinário. O bandido até que é sanguinário, mas enfim, de quem o título está falando? E “galante”? Como assim, ele galanteia alguém? Ou eles galanteiam um ao outro? E quem são os indomáveis? Isso por acaso é um documentário sobre potros xucros de Dom Pedrito, ou o que?

My darling Clementine – Paixão dos fortes. Ok, ok. “Minha querida Clementnia” soa estranhíssimo, até porque nos lembra daquele desenho do Xou da Xuxa em que um jumento saía cantando a musiquinha título. Mas... Paixão? Dos fortes? O que é isso? Uma versão de “As pontes de Maddison” estrelada por um elenco de alterofilistas?

Continua, infelizmente continua...

2 comentários:

Anônimo disse...

Outro faroeste que sofreu na tradução foi Shane, que virou "Os Brutos Também Amam". Mas não foi o único gênero vitimado pelos tradutores, outros clássicos como The Godfather (O Padrinho) que teve o simplório nome de "O Poderoso Chefão". É triste.

Pelo menos O Senhor dos Anéis não virou algo como "Um Anel da Pesada".

Urubu Antigo disse...

"Os brutos também amam" é um dos piores títulos na história do cinema. Entre outras coisas porque o protagonista não é um bruto, e os bandidos - que são brutos - não aparecem amando ninguém. Só dá pra supor que o título faz referência à vida íntima dos bandidos, que não aparece na história. Mas, também, não lamento muito, porque acho o filme ruim.